Há tempos que eu ouvira falar do Salto Yucuman – a mais longa queda d’água do mundo, situada na fronteira do Brasil com a Argentina, no rio Uruguai – e estava com saudades dos tempos em que Scheila e eu fazíamos as nossas viagens aventureiras.
Sabendo que a queda d’água ficava no Parque Estadual do Turvo – o último reduto no Estado do Rio Grande do Sul em que ainda havia onças-pintadas, caititus, antas e tamanduás -, foi feita a pesquisa pela Internet acerca das possibilidades de transporte, de hospedagem e de alimentação nas redondezas (http://www.bemtevibrasil.com.br/yucuma.htm, acessado em 30 de janeiro de 2007).
Os interessados podem ficar em Hotéis e Pousadas no Muncípio de Tenente Portela, mais próximo ao Parque.
Entretanto, sem dúvida, o que oferecia maiores possibilidades de transporte em relação a Porto Alegre era Frederico Westphalen.
Vimos também que o Parque Estadual do Turvo fora o primeiro a ser criado no Estado do Rio Grande do Sul, no ano de 1947, época em que a criação de parques estaduais se voltava muito mais à idéia de propiciar lazer do que, propriamente, à preservação da natureza.
Vinha, ainda, a recomendação de que não se tomasse banho no rio, tendo em vista a extraordinária força da correnteza.
Por outro lado, já se falava no projeto de construção da usina hidrelétrica de Roncador, que inundaria 25% do Parque e faria desaparecer o Salto, mesmo tendo ele sido declarado pela República Argentina, em 1992, Monumento Nacional.
Tomamos o ônibus até Frederico Westphalen, saindo às 22h45 de Porto Alegre, para chegarmos lá às 6h.
Combináramos a viagem com um taxista de nome Flávio, que nos pegaria na rodoviária, levar-nos-ia ao Parque e nos traria de volta a Frederico Westphalen.
Scheila aproveitou para comprar as passagens de volta, para as 15h30 do mesmo dia.
Enquanto o dia ia amanhecendo, passávamos por municípios como Tenente Portela, Taquaruçu do Sul, até chegarmos a Derrubadas, última cidade antes do Parque Estadual do Turvo.
Quando nos íamos aproximando, o Flávio nos chamou a atenção para um primeiro habitante selvagem: uma imensa lebre saltou na margem direita da estrada, próxima aos pés de soja que atapetavam a região inteira.
Ao chegarmos ao Parque, soubemos que ele se abriria às 8h.
Numa das árvores da entrada, vieram alguns tucanos pousar.
Pago o ingresso, seguimos de carro até uma clareira onde havia alguns quiosques, próximos a algumas árvores que eu só conhecia dos livros do Monteiro Lobato, como o guatambu, que aparece n’O saci.
A partir dos quiosques, seguimos a pé.
Em vários trechos do caminho, via-se mata cerrada, cruzavam a estrada pacas e marrecas; nenhuma onça, anta ou caititu cruzou nosso caminho.
Como dissera a nossa amiga, Dra. Roberta, que trabalhava, naquela ocasião, em Frederico Westphalen, a melhor época para visitar o Salto era esta mesma que escolhêramos: a queda estava bem visível, com um largo caminho passível de ser trilhado sobre as rochas.
Com efeito, o Flávio nos contou que um grupo de turistas viera em abril, certa ocasião, e se decepcionara, justamente pela falta de visibilidade.
Mas, vamos ao Salto.
Trata-se de uma imensa linha reta em diagonal, que, na época da seca, como dito, fica mais visível.
As pedras por sobre as quais a água do rio se precipitava pareciam ter sido empilhadas e soldadas entre si mediante a velha técnica que já víramos em toda a América Latina, sem argamassa.
Contudo, não era do conhecimento do nosso taxista e guia nenhuma lenda especíica da região acerca do Salto.
Parecia que as disputas pelo território entre os descendentes dos colonos europeus e os índios kaingangs tomaram em excesso o tempo que as pessoas teriam para frutificarem as narrativas – o que existiria antes, os índios, como expressão de um passado primitivo e degenerado, a ser abandonado ao esquecimento, o que se pretendia afirmar, a ação do colono de ascendência européia, voltada a tornar aquela região um centro irradiador da produção agrícola, mais especificamente, do agronegócio -.
As informações adicionais foram colhidas em documentos produzidos no âmbito acadêmico (http://geodesia.ufsc.br/Geodesia-online/arquivo/cobrac_2006/036.pdf, http://www.unisinos.br/ihu/uploads/publicacoes/edicoes/1158327280.69pdf.pdf, e acessado em 6 de maio de 2007).
Sabe-se que por ali passavam os tropeiros em direção à Feira de Sorocaba, durante os séculos XVII e XVIII, e que o Salto, na época da seca, constituiu um obstáculo – embora temporário – ao desmatamento da araucária, que se verificava no oeste do Estado de Santa Catarina, no sudoeste do Paraná e no noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, muito intenso a partir do povoamento daquela região por imigrantes, iniciado na segunda metade do século XIX, sobretudo a partir da fundação da Colônia Militar de Chapecó, em 1882, naquela região que disputamos com a Argentina até 1895.
Obstáculo porque o Salto impedia as barcaças de seguirem pelo rio até o ponto onde as toras da preciosa árvore seriam colhidas, para aproveitamento de sua madeira e de sua resina.
Até 1894-1895, a região permanecia praticamente intocada pelo homem branco, embora seu solo fosse muito fértil e a fauna fosse riquíssima.
Durante a Revolução Federalista, de 1893, muitos foram se refugiar naqueles restos de mata cerrada que existiam no Rio Grande do Sul.
O que atraiu muitos dentre os pioneiros fora o inegável potencial econômico, com a possibilidade de exploração da madeira de lei, a grande quantidade de animais para a caça, bem como as águas medicinais, amplamente exploradas, hoje, no município de Irai, tendo todos, entretanto, como fator de unidade, a religião, o que não deixa de estabelecer um paralelo com a história da conquista do Oeste nos EUA.
A partir da década de 20 do século XX, o afluxo de imigrantes se deu norteado por uma idéia de colonização baseada na economia familiar.
Mas, retornemos ao Salto.
A correnteza era extremamente forte e, em alguns trechos, na margem brasileira, havia inclusive redemoinhos.
Em ambas as margens, tanto na brasileira como na argentina, o verde era exuberante.
As aves selvagens cruzavam os céus.
Retornando aos quiosques, Scheila viu uma outra trilha que nos poderia levar a um outro ângulo de visão do Salto, e o Flávio lá nos foi levando.
E, com efeito, ali, onde a mata era um pouco mais cerrada, iríamos dar no início da elevação.
O retorno não teve maiores incidentes, nem perigos: a viagem trnascorreu tranqüilamente naquela região que, vez por outra, aparece agitada por conflitos entre agricultores brancos e índios kaingangs.
O que se verificou de notável, por ocasião da volta, além das várias paradas, foi a existência de ligação entre Frederico Westphalen e cidades do norte do Mato Grosso, como São Felix do Araguaia, mediante linhas de ônibus.
Sabendo que a queda d’água ficava no Parque Estadual do Turvo – o último reduto no Estado do Rio Grande do Sul em que ainda havia onças-pintadas, caititus, antas e tamanduás -, foi feita a pesquisa pela Internet acerca das possibilidades de transporte, de hospedagem e de alimentação nas redondezas (http://www.bemtevibrasil.com.br/yucuma.htm, acessado em 30 de janeiro de 2007).
Os interessados podem ficar em Hotéis e Pousadas no Muncípio de Tenente Portela, mais próximo ao Parque.
Entretanto, sem dúvida, o que oferecia maiores possibilidades de transporte em relação a Porto Alegre era Frederico Westphalen.
Vimos também que o Parque Estadual do Turvo fora o primeiro a ser criado no Estado do Rio Grande do Sul, no ano de 1947, época em que a criação de parques estaduais se voltava muito mais à idéia de propiciar lazer do que, propriamente, à preservação da natureza.
Vinha, ainda, a recomendação de que não se tomasse banho no rio, tendo em vista a extraordinária força da correnteza.
Por outro lado, já se falava no projeto de construção da usina hidrelétrica de Roncador, que inundaria 25% do Parque e faria desaparecer o Salto, mesmo tendo ele sido declarado pela República Argentina, em 1992, Monumento Nacional.
Tomamos o ônibus até Frederico Westphalen, saindo às 22h45 de Porto Alegre, para chegarmos lá às 6h.
Combináramos a viagem com um taxista de nome Flávio, que nos pegaria na rodoviária, levar-nos-ia ao Parque e nos traria de volta a Frederico Westphalen.
Scheila aproveitou para comprar as passagens de volta, para as 15h30 do mesmo dia.
Enquanto o dia ia amanhecendo, passávamos por municípios como Tenente Portela, Taquaruçu do Sul, até chegarmos a Derrubadas, última cidade antes do Parque Estadual do Turvo.
Quando nos íamos aproximando, o Flávio nos chamou a atenção para um primeiro habitante selvagem: uma imensa lebre saltou na margem direita da estrada, próxima aos pés de soja que atapetavam a região inteira.
Ao chegarmos ao Parque, soubemos que ele se abriria às 8h.
Numa das árvores da entrada, vieram alguns tucanos pousar.
Pago o ingresso, seguimos de carro até uma clareira onde havia alguns quiosques, próximos a algumas árvores que eu só conhecia dos livros do Monteiro Lobato, como o guatambu, que aparece n’O saci.
A partir dos quiosques, seguimos a pé.
Em vários trechos do caminho, via-se mata cerrada, cruzavam a estrada pacas e marrecas; nenhuma onça, anta ou caititu cruzou nosso caminho.
Como dissera a nossa amiga, Dra. Roberta, que trabalhava, naquela ocasião, em Frederico Westphalen, a melhor época para visitar o Salto era esta mesma que escolhêramos: a queda estava bem visível, com um largo caminho passível de ser trilhado sobre as rochas.
Com efeito, o Flávio nos contou que um grupo de turistas viera em abril, certa ocasião, e se decepcionara, justamente pela falta de visibilidade.
Mas, vamos ao Salto.
Trata-se de uma imensa linha reta em diagonal, que, na época da seca, como dito, fica mais visível.
As pedras por sobre as quais a água do rio se precipitava pareciam ter sido empilhadas e soldadas entre si mediante a velha técnica que já víramos em toda a América Latina, sem argamassa.
Contudo, não era do conhecimento do nosso taxista e guia nenhuma lenda especíica da região acerca do Salto.
Parecia que as disputas pelo território entre os descendentes dos colonos europeus e os índios kaingangs tomaram em excesso o tempo que as pessoas teriam para frutificarem as narrativas – o que existiria antes, os índios, como expressão de um passado primitivo e degenerado, a ser abandonado ao esquecimento, o que se pretendia afirmar, a ação do colono de ascendência européia, voltada a tornar aquela região um centro irradiador da produção agrícola, mais especificamente, do agronegócio -.
As informações adicionais foram colhidas em documentos produzidos no âmbito acadêmico (http://geodesia.ufsc.br/Geodesia-online/arquivo/cobrac_2006/036.pdf, http://www.unisinos.br/ihu/uploads/publicacoes/edicoes/1158327280.69pdf.pdf, e acessado em 6 de maio de 2007).
Sabe-se que por ali passavam os tropeiros em direção à Feira de Sorocaba, durante os séculos XVII e XVIII, e que o Salto, na época da seca, constituiu um obstáculo – embora temporário – ao desmatamento da araucária, que se verificava no oeste do Estado de Santa Catarina, no sudoeste do Paraná e no noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, muito intenso a partir do povoamento daquela região por imigrantes, iniciado na segunda metade do século XIX, sobretudo a partir da fundação da Colônia Militar de Chapecó, em 1882, naquela região que disputamos com a Argentina até 1895.
Obstáculo porque o Salto impedia as barcaças de seguirem pelo rio até o ponto onde as toras da preciosa árvore seriam colhidas, para aproveitamento de sua madeira e de sua resina.
Até 1894-1895, a região permanecia praticamente intocada pelo homem branco, embora seu solo fosse muito fértil e a fauna fosse riquíssima.
Durante a Revolução Federalista, de 1893, muitos foram se refugiar naqueles restos de mata cerrada que existiam no Rio Grande do Sul.
O que atraiu muitos dentre os pioneiros fora o inegável potencial econômico, com a possibilidade de exploração da madeira de lei, a grande quantidade de animais para a caça, bem como as águas medicinais, amplamente exploradas, hoje, no município de Irai, tendo todos, entretanto, como fator de unidade, a religião, o que não deixa de estabelecer um paralelo com a história da conquista do Oeste nos EUA.
A partir da década de 20 do século XX, o afluxo de imigrantes se deu norteado por uma idéia de colonização baseada na economia familiar.
Mas, retornemos ao Salto.
A correnteza era extremamente forte e, em alguns trechos, na margem brasileira, havia inclusive redemoinhos.
Em ambas as margens, tanto na brasileira como na argentina, o verde era exuberante.
As aves selvagens cruzavam os céus.
Retornando aos quiosques, Scheila viu uma outra trilha que nos poderia levar a um outro ângulo de visão do Salto, e o Flávio lá nos foi levando.
E, com efeito, ali, onde a mata era um pouco mais cerrada, iríamos dar no início da elevação.
O retorno não teve maiores incidentes, nem perigos: a viagem trnascorreu tranqüilamente naquela região que, vez por outra, aparece agitada por conflitos entre agricultores brancos e índios kaingangs.
O que se verificou de notável, por ocasião da volta, além das várias paradas, foi a existência de ligação entre Frederico Westphalen e cidades do norte do Mato Grosso, como São Felix do Araguaia, mediante linhas de ônibus.
O maior salto longitudinal do mundo pode desaparecer, mas isso não é nada perto do desastre que pode causar para as cidades vizinhas e o meio ambiente. Ou será o contrário? Veja mais em:
ResponderExcluirhttp://www.livrodemochila.com/2010/04/salto-do-yucuma/
Agradeço não só a visita como a indicação do seu site, pois, realmente, é um dos lugares que vale a pena não só conhecer como guardar na memória. Também postei ali um comentário.
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